domingo, 10 de abril de 2011

A Disciplina do Senhor - 1



Joubert de Oliveira Sobrinho, pr.
Palavra ministrada na Família Campo Belo – 03.04.11


“Filho meu, guarda o mandamento de teu pai, e não deixes a lei da tua mãe; Ata-os perpetuamente ao teu coração, e pendura-os ao teu pescoço. Quando caminhares, te guiará; quando te deitares, te guardará; quando acordares, falará contigo. Porque o mandamento é lâmpada, e a lei é luz; e as repreensões da correção são o caminho da vida”, Pv 6.20-23.

“Considerai, pois, aquele que suportou tais contradições dos pecadores contra si mesmo, para que não enfraqueçais, desfalecendo em vossos ânimos. Ainda não resististes até ao sangue, combatendo contra o pecado. E já vos esquecestes da exortação que argumenta convosco como filhos: Filho meu, não desprezes a correção do Senhor, E não desmaies quando por ele fores repreendido; Porque o Senhor corrige o que ama, E açoita a qualquer que recebe por filho. Se suportais a correção, Deus vos trata como filhos; porque, que filho há a quem o pai não corrija? Mas, se estais sem disciplina, da qual todos são feitos participantes, sois então bastardos, e não filhos. Além do que, tivemos nossos pais segundo a carne, para nos corrigirem, e nós os reverenciamos; não nos sujeitaremos muito mais ao Pai dos espíritos, para vivermos? Porque aqueles, na verdade, por um pouco de tempo, nos corrigiam como bem lhes parecia; mas este, para nosso proveito, para sermos participantes da sua santidade. E, na verdade, toda a correção, ao presente, não parece ser de gozo, senão de tristeza, mas depois produz um fruto pacífico de justiça nos exercitados por ela. Portanto, tornai a levantar as mãos cansadas, e os joelhos desconjuntados, E fazei veredas direitas para os vossos pés, para que o que manqueja não se desvie inteiramente, antes seja sarado. Segui a paz com todos, e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor”; Hb 12.3-14

Visões deturpadas da disciplina

A palavra disciplina vem do latim e significa “instrução”, “treinamento”. Ela apresenta conotações amplas: modo de vida de um grupo (incluindo seus métodos e penas aos transgressores); tipo de vida ascética e de penitência; flagelos da correção da vida monástica; treinamento sistemático visando aprimoramento e cumprimento de algum propósito e; curso acadêmico ou matéria de estudo.

Enquanto a Bíblia declara a disciplina natural e necessária, para alguns pais a palavra disciplina adquiriu uma conotação de autoritarismo, abuso e falta de diálogo típico das gerações anteriores, motivo de seu banimento na educação dos filhos, segundo Dr. Içami Tiba. O construtivismo, uma linha pedagógica experimentada a partir dos anos 80, por exemplo, repudia qualquer ação disciplinar, considerando-a arcaica, controladora e prejudicial.

“[Disciplina] não é obediência cega às regras, como um adestramento, mas um aprendizado ético, para se saber fazer o que deve ser feito, independentemente da presença de outros. Aliada à ética, a disciplina gera confiança mútua nas pessoas – um dos fortes componentes do amor saudável que traz progresso à humanidade. Disciplina é um dos fortes ingredientes da competência profissional, da cidadania, da boa convivência familiar, do aprendizado escolar, da economia psíquica e financeira, da ponderação e da felicidade... Tenho insistido em que um dos pilares para consolidar a sociabilidade é a disciplina, base fundamental para a formação e organização de toda e qualquer pessoa, estrutura, família, grupo e sociedade.” (TIBA, 2006, p. 15,16).

Percebam o plano maligno de tirar a potência, denegrir a ideia de disciplina a fim de impedir a edificação do caráter dos indivíduos:

Na Suécia, pais suecos foram presos por aplicar disciplina. Governo lhes tirou os filhos. No final de 2010, um tribunal regional da Suécia sentenciou um casal a nove meses de cadeia para cada um e os multou o equivalente a 10.650 dólares depois que eles confessaram que batiam em três de seus quatro filhos como parte normal de seus métodos de educar e disciplinar filhos. Em 1979, a Suécia tornou crime os pais aplicarem castigo físico nos filhos, uma medida que foi o primeiro passo, de acordo com um advogado de direitos dos pais nos EUA, para o Estado sueco praticamente se apoderar de toda a autoridade e direitos dos pais. Documentos do tribunal, citados pela Televisão Sveriges, disseram que os pais, cujos nomes não foram divulgados na imprensa, “explicaram que haviam usado o que eles mesmos descreviam como bater e castigo físico como parte de seus métodos de criar os filhos”. Os documentos disponibilizados não dão nenhuma indicação de que os pais cometiam abusos, e o tribunal ainda comenta que os pais “tinham um relacionamento de amor e cuidado com os filhos”. Apesar disso, os pais foram mandados para a prisão e multados em 25.000 coroas suecas para cada um dos “filhos afetados”. Os filhos foram enviados para um orfanato sustentado pelo Estado, onde estão desde junho deste ano, e Mike Donnelly, diretor de relações internacionais da Associação de Defesa Legal da Educação Escolar em Casa (ADLEEC), que tem sede nos EUA, disse para LifeSiteNews.com que é “extremamente improvável” que os filhos sejam devolvidos para sua família. Donnelly disse que esse caso é típico dos casos de muitas famílias com valores tradicionais na Suécia: “Na área de direitos da família na Suécia, as coisas realmente não estão indo bem ali”. Fonte: http://noticiasprofamilia.blogspot.com/2010/11/pais-suecos-sao-presos-por-aplicar.html

A disciplina na Bíblia

No AT, disciplina (heb. mûsãr, yãsar) geralmente indica instrução com recompensas e punições visando orientar a conduta de obediência às leis divinas. De Deus emana a disciplina: “E hoje sabereis que falo, não com vossos filhos, que o não sabem, e não viram a instrução do SENHOR vosso Deus, a sua grandeza, a sua mão forte, e o seu braço estendido”, Dt 11.2. A Lei do Senhor ou de Moisés é um aspecto desta disciplina com recompensas e punições.
Ouve, filho meu, e aceita as minhas palavras, e se multiplicarão os anos da tua vida. No caminho da sabedoria te ensinei, e por veredas de retidão te fiz andar. Por elas andando, não se embaraçarão os teus passos; e se correres não tropeçarás. Pv 3.10-12.

Em Lv 26.14-39 há uma lista de castigos que poderiam vir sobre o povo que desprezasse a Lei do Senhor. Se lêssemos de relance poderíamos nos espantar com toda a sorte males: pragas, pestes, pobreza, feras selvagens, lavouras improdutivas, destruição de propriedades, fome, espada, cativeiro, medo, saudade, enfermidades, desolação e morte. No entanto, uma leitura acurada nos mostra que o interesse divino era o retorno do povo à comunhão divina. A cada dois ou três versículos há uma declaração de Deus dizendo “e se ainda não me derem ouvidos...”, mostrando que por detrás da punição está o amor de um Pai quem não quer o mal dos filhos.

No NT, disciplina (gr. paideia, paideuõ) traz a ideia de instrução e orientação de natureza positiva, associada mais ao amor que à lei. Jesus elevou a disciplina a um meio essencial e desejável de alcançar altos objetivos; o termo é aplicável a treinamento de crianças e modos de correções com a finalidade de conduzir ao propósito correto.

Entende-se, então, a disciplina bíblica como instrução, correção, admoestação, ensino e treinamento que aprimora, molda, atribui força, completa, valoriza e aperfeiçoa o caráter. É educação moral obtida através da submissão à obediência por meio da supervisão, inspeção criteriosa e minucioso exame, quer seja no treino infantil do cultivo da mente para a obediência e cuidado do corpo, quer seja no treino do adulto, no cultivo da alma através da correção de erros e contenção das paixões para a purificação e o crescimento nas virtudes. Ela é uma virtude que emana de Deus e é delegada a instituições como governo, famílias, igrejas e escolas, e deve encontrar morada nos indivíduos.

A disciplina efetuada pelo Pai celestial tem em paralelo a figura do pai humano que corrige seus filhos: “Saberás, pois, no teu coração que, como um homem corrige a seu filho, assim te corrige o Senhor teu Deus”, Dt 8.5. A filiação espiritual do crente é assegurada através da disciplina divina. O amor de Deus permeia e é a fonte de suas repreensões e ações corretivas, pois tem a finalidade de prover benefício e cumprir o seu bom propósito.

Porque a disciplina é necessária

O homem e a mulher foram criados em destaque, num plano superior, acima de todas as demais criaturas da terra; ambos foram criados deliberadamente, não acidentalmente, à imagem e semelhança de Deus, isto é, de certa maneira, parecidos com Deus e, ao mesmo tempo, distintos dos animais, com faculdade e disposição para se relacionarem pessoal e conscientemente com o Criador de maneira única. Afora os atributos divinos exclusivos, verificam-se características semelhantes, entre o ser humano e Deus, nos atributos morais oriundos do caráter de Deus e que fazem parte das qualidades morais humanas: bondade, amor, misericórdia, clemência, compassividade, paciência, fidedignidade, fidelidade, justiça, etc., além das competências de autorreflexão, autoconsciência, autodeterminação, transcendência, perscrutação, conhecimento, sociabilidade, criatividade, etc.

Adão e Eva viviam de forma ilibada, em total inocência, ausência de malícia, vergonha ou culpa pelo desconhecimento do bem e do mal. “Além de serem inocentes, sem malícia, Adão e Eva eram moralmente virtuosos em função do estado em que foram criados, pois Deus os dotou de perfeição moral. [...] não denota meramente a ausência de maldade, mas também a presença da bondade – não se trata, simplesmente, da ausência de vício, mas a presença real da virtude.” (GEISLER, 2010, p. 12)

Ao comerem do fruto proibido Adão e Eva perpetraram a desobediência e se tornaram pecadores trazendo sobre si condenação que se estendeu para toda a sua descendência. “...pela desobediência de um só homem, muitos foram feitos pecadores, Rm 5.19. Sem coação e por livre decisão da vontade, o casal decidiu desafiar a Deus, rejeitar sua Palavra e dar credibilidade à palavra enganadora e rebelde de Satanás gerando morte, depravação, destruição, trágicas consequências para toda a Criação e para todas as estruturas do ser humano onde dantes habitava a inocência, a virtude, a santidade e a plena comunhão divina.

Portanto, a disciplina é fundamentalmente necessária ao ser humano por causa do estado de imperfeição de sua natureza pecaminosa. Sem a disciplina não haverá saúde no caráter, paz na família, equilíbrio na sociedade nem felicidade. Ela deve ser bem aplicada, com base nas orientações divinas, e bem recebida, já que o objetivo de sua aplicação saudável é o retorno à perfeição da imagem e semelhança de Deus e o cumprimento do propósito divino para a existência, como exposto no texto de Hb 12.5-11.

A pior situação para um ser humano é estar sem a disciplina do Senhor

Por outro lado, a ausência de instrução evidencia desafeição, ódio e desdém, conforme Hb 12. A correção é parte do amor dedicado a trazer crescimento e maturidade àquele que faz parte da família.

O pior que pode acontecer é Deus deixar de nos disciplinar, como fez com Israel, por um tempo: Efraim está entregue aos ídolos; deixa-o, Os 4.17. Também em Jr 7.28. Significava que já não havia sensibilidade no povo para reagir em retorno a Deus. O castigo seria inútil. O mesmo é descrito em Isaías 1.5: Por que seríeis ainda castigados, se mais vos rebelaríeis? Isto significa que não adiantava corrigir, a insensibilidade por causa do pecado já tinha endurecido e enfermado o coração. É isto o que ocorre quando os homens freiam a verdade de Deus e escolhem se manter na injustiça, conforme Paulo em Rm 1.24,26,28: Por isso também Deus os entregou às concupiscências de seus corações, à imundícia, para desonrarem seus corpos entre si; Por isso Deus os abandonou às paixões infames. Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural, no contrário à natureza. E, como eles não se importaram de ter conhecimento de Deus, assim Deus os entregou a um sentimento perverso, para fazerem coisas que não convêm;

No Salmo 73, Asafe descreve a vida dos que não têm a disciplina do Senhor. A eles, aparentemente, nenhum mal ocorre. Não eram disciplinados, corrigidos; todo o caminho lhes era aberto para fazerem o que bem entendessem. Isto incomodou tanto Asafe que este chegou a questionar a razão de se manter buscando a pureza enquanto aqueles viviam regaladamente em seus pecados. Porém o salmista, no santuário, teve uma revelação: viu o fim deles e compreendeu que não vale a pena deixar de se submeter à orientação de Deus.

Continuaremos no próximo estudo a tratar deste assunto. Veremos alguns exemplos de personagens bíblicos que se submeteram à disciplina do Senhor em diferentes níveis e como o Senhor disciplina seus filhos de forma diferente, justa, de acordo com o crescimento e maturidade de cada um.

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